Aprende a escrever na areia

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Dois amigos, Mussa e Nagib, viajavam pelas longas estradas que recortam as montanhas da Pérsia. Eram nobres e ricos e faziam-se acompanhar por servos, ajudantes e caravaneiros.



Chegaram, certa manhã, às margens de um grande rio barrento e impetuoso. Era preciso transpor a corrente ameaçadora. Ao saltar, porém, de uma pedra, Mussa foi infeliz e caiu no torvelinho espumejante das águas em revolta. Teria ali perecido, arrastado para o abismo, não fosse Nagib. Este, sem a menor hesitação, atirou-se à correnteza e livrou da morte o seu

companheiro de jornada.



Que fez Mussa?



Ordenou que o mais hábil de seus servos gravasse na face lisa de uma grande pedra, que ali se erguia, esta legenda admirável:



Viandante:

Neste lugar, com risco da própria vida,

Nagib salvou, heroicamente, seu amigo Mussa.



Feito isso, prosseguiram, com suas caravanas.



Cinco meses depois, em viagem de regresso, encontraram-se os dois amigos naquele mesmo local perigoso e trágico. E, como estivessem fatigados, resolveram repousar à sombra acolhedora do lajedo que ostentava a honrosa inscrição. Sentados, pois, na areia clara, puseram-se a conversar. Eis que, por motivo banal, surge, de repente, grave desavença entre os

dois companheiros.



Discordaram. Discutiram. Nagib, exaltado, num ímpeto de cólera, esbofeteou brutalmente o amigo.



Que fez Mussa?



Que farias tu, em seu lugar?



Mussa não revidou a ofensa. Ergueu-se e, tomando tranqüilo o seu bastão, escreveu na areia, ao pé do negro rochedo:



Viandante:

Neste lugar, por motivo fútil,

Nagib injuriou, gravemente, seu amigo Mussa.







Surpreendido com o estranho procedimento, um dos ajudantes de Mussa observou respeitoso:



-Senhor! Da primeira vez, para exaltar a abnegação de Nagib, mandastes gravar, para sempre, na pedra o feito heróico. E agora, que ele acaba de ofender-vos tão gravemente, vós vos limitais a escrever na areia incerta o ato de covardia! A primeira legenda, ó meu mestre, ficará para sempre.



Todos os que transitarem por este sítio dela terão notícia. Esta outra, porém, riscada no tapete de areia, antes do cair da tarde terá desaparecido como um traço de espuma entre as ondas buliçosas do mar.



-A razão é simples - respondeu Mussa. O benefício que recebi de Nagib permanecerá, para sempre em meu coração. Mas a injúria... essa negra injúria... escrevo-a na areia, como um voto, para que, se depressa daqui se apagar e desaparecer, mais depressa ainda desapareça e se apague de minha lembrança!





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Eis a sublime verdade, meu amigo! Aprendamos a gravar, na pedra, os favores que recebermos, os benefícios que nos fizerem, as palavras de carinho, simpatia e estímulo que ouvirmos.

Aprendamos, porém, a escrever na areia as injúrias, as ingratidões, as perfídias e as ironias que nos ferirem pela estrada agreste da vida. Assim seremos todos felizes.



(Adaptada do livro "O gato do cheique e outras histórias" de Malba Tahan - Ediouro)

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